CONTRATO DE SEGURO OBRIGATÓRIO DE RESPONSABILIDADE CIVIL AUTOMÓVEL EM S. TOMÉ E PRÍNCIPE









NOTAS SOBRE O CONTRATO DE SEGURO OBRIGATÓRIO DE RESPONSABILIDADE CIVIL AUTOMÓVEL EM S. TOMÉ E PRÍNCIPE


Por Miris Bernardo*



São Tomé e Príncipe (STP), localizado no Golfo da Guiné, Oceano Atlântico, é um país em desenvolvimento que enfrenta sérios problemas de segurança rodoviária, em resultado do crescente número de transportes motorizados, má qualidade das vias e do comportamento dos automobilistas.


O seguro automóvel em STP não é um seguro obrigatório e mesmo o facultativo é pouco contratado pelos condutores. Apesar da legislação existente, ainda não está universalizada a obrigatoriedade do seguro para todos os veículos, sendo apenas exigido aos veículos importados o cumprimento dessa exigência no acto de despacho alfandegário. Dessa forma, depois de entrarem em circulação, os condutores não têm incentivos para manter o seguro inicialmente contratado.


Natureza Jurídica

O Seguro de Responsabilidade Civil é um contrato pelo qual a seguradora garante o segurado contra os danos resultantes para o património deste, dos pedidos de indemnização baseados em responsabilidade civil contra ele apresentados por terceiros. De outro modo, de acordo com as regras da responsabilidade pelo risco, seria o condutor a responder pelos danos causados pelo seu veículo, independentemente de culpa (responsabilidade objectiva ou pelo risco).


O Seguro de Responsabilidade Civil não cumprirá integralmente a sua função de despersonalização do dever de indemnizar (transferindo da pessoa do actor do dano para a seguradora) se não for, simultaneamente, ilimitado e obrigatório. Só assim se substituirá, inteiramente, num determinado sector da responsabilidade civil, a seguradora ao segurado, passando aquela a responsabilizar-se, em todos os casos, por toda a responsabilidade civil do segurado.


Falando de seguro ilimitado, não queremos referir-nos à cobertura de todos os riscos susceptíveis de afectarem o Homem ou o seu património, mas unicamente ao seu montante. Até, porque, parece impossível o seguro de todos os riscos.


O caso de São Tomé e Príncipe

A motorização cada vez mais intensa, em STP, faz coincidir os potenciais responsáveis pelos sinistros rodoviários com a colectividade dos potenciais lesados. Ou seja: a soma dos interesses segurados ou seguráveis contra o risco da responsabilidade civil em causa, tende, progressivamente, a coincidir com a soma dos interesses segurados ou seguráveis contra o risco de danos às pessoas ou coisas por causa da circulação automóvel.


Contudo, STP ainda está longe do tempo em que se possa afirmar que a maioria dos cidadãos são-tomenses tem um interesse igual em segurar-se contra os danos e para o caso de responsabilidade. É primordial que haja uma legislação de seguro obrigatório em STP para o bem dos terceiros lesados e mesmo para a segurança rodoviária em si. E que essa legislação seja aplicada de forma efectiva.


A transição do seguro facultativo para o obrigatório reflecte uma significativa alteração dos interesses em causa. No primeiro momento, o seguro, embora indo beneficiar o lesado, é contratado por quem quer tutelar o seu próprio património contra eventualmente pesadas obrigações de indemnizar. É, portanto, o interesse do segurado que prevalece. Numa segunda fase, ao tornar-se o seguro obrigatório, fá-lo com vista à protecção dos eventuais lesados, colocando, deste modo, o benefício que de tal contrato resulta para o lesado na posição de finalidade principal do seguro.


É evidente que o seguro obrigatório de responsabilidade civil automóvel tende a

absorver a função do seguro directo, com atribuição ao lesado da possibilidade de

accionar directamente a seguradora do responsável.


Apesar dos inconvenientes de um seguro obrigatório para a população são-tomense, em que maioria carece de recursos económicos e teria, desta feita, grandes dificuldades para suportar o peso excessivo que os prémios dos seguros obrigatórios representam, estamos certos que sobrelevam as vantagens do seguro obrigatório. O facto é ser esta transição consequência – até agora vista como necessária – dos tempos presentes. E, por isso mesmo, estamos quanto ao seguro, aliado fiel da responsabilidade objectiva e da responsabilidade pelo exercício de actividades que envolvem um acréscimo de riscos em relação ao normal viver em sociedade.


Além da consagração do seguro obrigatório, os diversos sistemas jurídicos tendem a apresentar, na linha traçada pela Convenção de Estrasburgo de 1959, determinadas características comuns, entre as quais sobressaem as seguintes para STP: atribuição ao terceiro lesado de um direito próprio contra a seguradora; a inoponibilidade por parte deste de algumas, ou mesmo da totalidade das excepções que poderia opor ao segurado com base no contrato de seguro; a criação de fundos de garantia ou a actuação de outros processos técnicos (por ex., a criação de seguros complementares, através dos quais se alcançam os mesmos efeitos práticos) para assegurar, no todo ou em parte, a reparação dos danos sofridos pelas vítimas de acidentes causados por condutores desconhecidos ou não segurados e insolventes.


Outro aspecto bastante importante é o mercado. Carece uma entidade com poderes mais amplos na regulação do seguro, ou pelo menos que seja um poder mais claro e especializado num sector do Banco Central. Além disso, o mercado deve ser aberto a mais empresas, sob pena de não haver concorrência e melhoria da oferta nas condições gerais e particulares oferecidas actualmente.


Por fim, espera-se também um maior esforço dos demais intervenientes, tais como a Polícia Nacional, através de uma maior fiscalização desse aspecto, a Direcção dos Transportes Terrestres, com uma maior regulamentação nomeadamente através das inspecções periódicas obrigatórias e dos próprios tribunais na medida em que estes desempenham um papel único da determinação judicial dos danos e correspondente compensação, principalmente nos danos corporais e morais.


Miris Bernardo

*Advogada Estagiária



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